sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

A ARTE DE COMUNICAR





BARCELONA, Colagem e técnica mista sobre papel, @ joaquim alves, 2006


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Uma homenagem aos produtores de comunicação.





domingo, 6 de janeiro de 2008

REPOSIÇÃO




DA ALMA
tantas vezes
parva





As pedras brancas da calçada da minha rua
são brancas porque a chuva as lavou.
As pedras brancas da calçada da minha rua
são brancas porque o vento as poliu.

As pedras brancas da calçada da minha rua
são brancas porque a neve as cobriu.
As pedras brancas da calçada da minha rua
são brancas porque o sol assim as tornou.

As pedras brancas da calçada da minha rua
são brancas porque sangue quente
corre ainda nas veias dos homens.


**


Morrer devia ser assim:
lavar a cara com areia fina
e mergulhar no mar adormecido.


**

Não havia memória.
Havia chão.


**

Levei as minhas mãos ao teu rosto.
Levei as minhas mãos às tuas mãos.
Levei as minhas mãos ao teu corpo.
E tu sorriste.
Os milagres que as mãos fazem!



**


Roubei girassóis da varanda da casa da minha tia.
Roubei-os, mas com ajuda!
Comigo foram o Almada e o Régio,
o Eugénio e o Fernando.
Um assalto, sem cúmplices,
nunca seria verdadeiro e credível.
Trepei pelo granito,
segurei-me às ripas,
arranquei as plantas,
e atirei-as para baixo.
Tudo isto,
enquanto a minha tia dormia.
Almada ficou com três.
Se não me engano, o Régio com duas.
O Fernando apanhou a outra.
O último girassol trouxe-o comigo.
Ainda o guardo como recordação.
Quem pode colocar ordem,
nesta minha confusão,
é o Zé Gomes que tudo fotografou.
A claque também não faltou.
Presentes: o Alexandre, o Ary
e a Natália; Dinis, Florbela e Garrett.
Estes que nem convidados foram!
Juntaram-se alguns populares,
por vontade própria e espontânea,
mais uns tantos estrangeiros que,
por ali, turismo faziam.
Os jornalistas avisados não foram.
Mas houve reportagem,
três semanas depois,
num qualquer diário da capital.
Era uma sexta-feira quaresmática.
Disso recordo-me,
de acordo com o calendário
da Magna e Santa Igreja Católica.
O Belo assegura-me que esteve
um lindo dia de sol.
Não me lembro...
Sei que desci, colocando os pés
nas pedras por onde subi.
Eram-me tão familiares,
como as minhas mãos.
Girassóis roubei da varanda
da minha tia.
E ela perdoou-me,
quando lhe disse que era
para o Vicente os pintar.
Roubei girassóis para Van Gogh.
E guardo ainda
um original da série,
em casa da minha tia.
Se vale milhões, não sei.
Tudo é, quase sempre,
pouco mais que nada.


**

Por que não podemos apagar as palavras,
fazer delas um incêndio, uma inundação…
Depois, escrever tudo de novo
com nomes que não soubemos nomear
e imagens que inventar não pudemos.
Tudo mais e mais verdadeiro.
Por que não podemos rasgar a carne,
os ossos, os olhos, para podermos dizer,
ao menos uma vez na vida:
Viva a página.
Viva a mão.
Vivam os dias.


**


Por um pouco mais de sonho,
azul como esta tinta que uso;
por um pouco mais de vida,
darei todo o oiro que não tenho,
aquela imensa força de luta,
o meu coração e vontade.
Por um pouco mais de azul,
Lisboa pode servir de troca;
porque a minha pátria não é
a língua portuguesa.
A minha pátria não é aqui,
onde moro ou trabalho.
A minha pátria (querem saber?)
é tudo em que acredito.



@private/outubro 20007
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