quarta-feira, 21 de novembro de 2007

AMPHORA

Convém revelar
a quem o não saiba
que este texto
tem matura idade
e
culpa minha
nenhuma


Para que conste









Amphora




Encontrámos aqui o vinho, o gelo, o copo, o silêncio,

num lugar ermo de terra feito

e madeira velha por tempo:

o ressuscitar dos nossos sentidos e voz;

A escrita germinando

nos degraus húmidos do resistir.

Não há inverno nem verão. Ninguém fala.

Escuta-se o rumor do vento, se o vento sopra,

o silêncio da casa, da amphora.

E há vinho: natureza fresca.

E há mel, recolhido cuidadosamente no ano anterior.

Encontrámos aqui o vinho, o gelo, o copo, o corpo.

E fizemos amor.

*

Que casa querer depois desta casa?

Que corpo desejar depois do corpo ali?

*

Molhámos os corpos nos riachos

gerados no interior da neve e da montanha,

irmanados naquela mútua recompensa de gurgitares:

nós e as fontes; nós e as pequenas quedas de água,

no verdadeiro silêncio da terra.

*

Não havia memória.

Havia chão.

*

Às vezes, sentávamo-nos nas gotas de orvalho,

suspensas na relva

e revíamo-nos nos espelhos das nuvens dispersas,

vagueando em sonhos.

Adormecíamos, por vezes.

Acordávamos tão leves...

*

O frio não era motivo de abandono.

Habitávamos a casa, as réstias de sol,

a luz matinal coada na limpidez do espaço.

Fazíamos o jogo paciente da aranha tecendo a sua rede.

Seguíamos-lhe os movimentos.

Apreciávamos a lentidão das suas esperas.

Sentíamos pena das suas vítimas.

Como libertá-las, sem quebrarmos os ténues braçosda prisão?

*

Era o equilíbrio natural que absorvíamos.

Amávamos. Conjugados no todo de um ambiente primordial.

E quem somos, para podermos quebrar o sossego da harmonia,

construída em todos os recantos

deste terno e pequeno mundo?

Sentávamo-nos, por vezes, no musgo.

Na frescura da terra semeada de pinheiros.

Viajávamos, depois, aos confins do eco

e nossas vozes regressavam mais quentes.

De amor.

*

E quando a mágoa espreitava

sob um sorriso,

dizias somente:

a noite só vem

quando os olhos se fecham de cansaço.

Antes, é a sempre e repetida loucura

dos encontros sem fim, sem fundo,

no outro lado do mundo.

*

Era a manhã vinha ao nosso encontro.

Em busca de um beijo húmido,

nascido no interior da noite.

Caminhava pela madrugada preguiçosa

e removida das entranhas do desejo.

Amanhecia. Ou eras tu que caminhavas

à procura de um silêncio

envolto em nevoeiro matinal?

*

Respiravas sonhos inteiros

à medida dos teus olhos erguidos

na direcção da luz.

Havia um sol razante no arvoredo.

Um reflexo enorme na tua mão.

E o frio ainda não tinha nascido.

*

Brilhavam auroras nos teus olhos.

Nos teus cabelos batia o vento.

E as searas permaneciam atentas

ao lento declinar da tarde.

Um sentimento natural unia-nos

ao cheiro cinzento da terra.

Como penetrar a penumbra do sol,

sem desperdiçar o tempo da erva?

*

Baixo os olhos à torrente de água que nos liga.

Os teus olhos prendem-se atentos

ao lento declinar da tarde

e espantam-se.

A água não mais é cor de água.

Transporta, num turbilhão de nervos,

nosso sangue,

à procura de repouso

no interior mais fundo da terra.

*

Uníamos o cheiro da terra

ao intenso florir dos nossos olhos,

no espanto natural de termos mãos.






quarta-feira, 31 de outubro de 2007

QUASE PERFEIÇÃO

Quase


Quase perfeita
a razão do gesto
que não aconteceu.
Quase perfeita
a memória do gosto
que se perdeu.
Quase perfeita
a mão
que escreveu
e não rasgou
palavras amargas.
E a doçura ali tão perto:
ali mesmo ao lado.
Metade da alma
partida,
perdida...
Quase perfeita,
a intenção!


Monte Abraão, 30. outubro. 2007

quarta-feira, 11 de julho de 2007

EM LOUVOR DO ACASO E DO ESPANTO


Pormenor de foto de telas sobrepostas
por um mero acaso.



(para o Manuel Anastácio, sem acaso.)




O ESPANTO




Há coisas que não deixam de nos espantar.
Não conseguir dormir (vá lá saber-se o seu porquê),
não resistir àquele filme do Alfredo, do François,
do Roman, do Bresson, da Duras e mais mil nomes
que não me ocorrem.
Voltando ao importante, por agora,
há coisas que não deixam de nos enpantar.
Um record mundial em apenas cem metros,
mesmo que seja numa piscina,
ou um 470 português que sabe velejar
como eu não imagino.
Mas voltando ao mais importante do importante,
o espanto é termos mãos
e capacidade para cozer o barro
e fazer viagens a marte e arredores
e querermos mais e mais ainda
sempre como nos fica bem
e acreditar que é possível transformar
este mundo infeliz (fica bem e devemos)
devemos afirmar todos os dias
a humildade de sermos humanos e reais
com capacidade de sonhar pois sonhar
todos os dias
todos os dias
todos os dias
até ao suspiro final.





(Sem nenhum amen, please!)

quarta-feira, 27 de junho de 2007

GALERIA 1 - ArtBox

IN COMPUTER





velas I


velas II



marina I








terça-feira, 26 de junho de 2007

ART Box 21





ARTbox 20


ARTbox 18


ARTbox 17


ARTbox 16


ARTbox 15


ARTbox 14


ARTbox 12


ARTbox 11


ARTbox 10


ARTbox 9


ARTbox 8


ARTbox 7





Pormenor de "Les amants",
Acrílico sobre tela, 140x230 cm, 1988


ARTbox 6

Desenho em computador, 1996

ARTbox 5


ARTbox 4


ARTbox 3


ARTbox 2


ARTbox 1


ART BOX



Aqui se inicia a publicação de uma série de trabalhos


do arquivo pessoal, realizados pelo próprio


e, maioritariamente, inéditos.

sábado, 16 de junho de 2007

ADIVINHEM DE QUEM É

(Excepcionalmente, entra aqui a escrita inglesa. Sem mais comentários.)

(Ó dessa!...)
*********************************************************
ODESSA
Fourteenth of February,
eighteen ninety-nine,
the British ship Veronica was lost without a sign.
Baa baa black sheep, you haven't any wool.
Captain Richardson left himself a lonely wife in Hull.
Cherub, I lost a ship in the Baltic sea.
I'm on an iceberg running free.
Sitting, filing this berg to the shape of a ship;
sailing my way back to your lips.
One passing ship gave word thatyou
have moved out of your old flat,
you love the Vicar more than words can say.
Tell him to praythat I won't melt away
and I'll see your face again.
Odessa, how strong am I?
Odessa, how time goes by.
Treasure, you know the neighbours that live next door,
they haven't got their dog anymore.
Freezing, sailing around in the North Atlantic,
can't seem to leave the sea anymore.
I just can't understand why you just moved to Finland.
You love that Vicar more than words can say.
Ask him to praythat I won't melt away
and I'll see your face again.
Odessa, how strong am I?
Odessa, how time goes by.
Oooh, ooooh....Fourteenth of February,
eighteen ninety-nine,
the British ship Veronica was lost without a sign.
**********************************************
(Acontece. Até aos melhores. Adivinhem quem canta.)

POESIA & MATEMÁTICA NA ANTENA 1




(Após a audição de uma excelente conversa,
made in Antena 1, 15/16 junho 2007)

IRONIA

liberto-me
ganho asas
levanto voo

como se libelinha fosse

paro no lago
busco alimento
sigo em frente

como se selvagem fosse

solto-me
sou livre
assim quero

caio na armadilha

preso fico
tento levantar-me
faltam-me forças

com que então
querias voar
insistem

liberdade frágil
aparente
democracia

viva a câmara
de lisboa


(Inteiramente dedicado à visão de Jorge Nuno Silva
e, por tabela, a João Pedro Neto e José Luís Fachada.)

sábado, 9 de junho de 2007

ANTES DO DIA

sem título, técnica mista @manus 2007


O CALDO ENTORNADO

Nem imaginado tinha
o que se ia passar
estavam todos acordados
e o telefone não tocou
precisava
de um bom dia inesperado
que não chegou
anda tudo atrasado
não vale a pena lamentar
tanta ausência
provoca esta dimensão
fugir da nossa esfera
recuar com a maré
e se a rocha for mole
viva o mexilhão
recupere o pé
e volte a terra
por sua mão
já agora
junte uns amigos
faça uma cataplana
respire fundo
festeje a vida
encomende uns frangos assados
sirva com piripiri
e batata frita
salada mista de alface
agrião e tomate
não esquecendo a velha cebola
já que a vida tem mais valor
com tempero adequado
nada de truques
pois as magias estão caras
mesmo que o barco meta água
e as velas se agitem
há sempre uma hipótese
de voltar a comer um bife

quarta-feira, 30 de maio de 2007

NEM MAIO NEM MADURO



NEM MAIO NEM MADURO


já não vale a pena pedir
chuva no nabal sol na eira

já não vale a pena esperar

lá se foram todas as esperanças
todos os sonhos e quimeras vãs
todas as mãos que podiam
fazer regresso às origens

esta manhã em dia de greve
o senhor Mundo morreu
sem deixar descendência

acabou a geração rasca a de oiro
a de prata a ilustre a ilusória
a que não vai vir acabou-se

tudo ó tudo
o que era vaidade
e vento que não passou
nem passar vai

nem em maio já se pode confiar

paciência
que tarde já ontem era

quinta-feira, 24 de maio de 2007

LIBERDADE DAS PALAVRAS






Já no vento me fui embora
porque esperava
que me parassem
fizessem voltar atrás
e não me fosse embora

não funcionou
a estratégia que era simples
não funcionou

perderam-se as palavras
comunicação desnecessária
para tão milhares de fotogramas
por hora e dia e mês e anos
e séculos

só o espanto fica no segundo

naquele espaço de
não sei que dizer
é demais para mim
não tenho palavras
não tenho palavras

palavras para quê
palavras palavras
leva-as o vento
e para lá das ditas
e concretas palavras
o que resta quando resta
é o mistério de haver
palavras por descobrir
tantas palavras
que
davam
para
ficar
eternamente
a dizer
a escrever
a debitar

sonhos quentes
quimeras vãs
sonetos d'outros tempos
memórias da noite
todas as manhãs

davam
e dão

quando
a gente quer
e elas

deixam

MENSAGEM COM DIRECÇÃO




Ilustrações para o Caderno Primeiro @manus 2006/ pequenos formatos



(Txt. enviado para a Truca do Luís Gaspar,
a propósito de pérolas ouvidas no Estúdio Raposa.)
http://www.estudioraposa.com
http://www.truca.pt


SILÊNCIO DAS ONDAS


(Aqui ficam palavrinhas do silêncio da noite,
em ondas redondas, como as escritas.)



Estive a ouvir os últimos Lugares (53 e 54)
e, também,comentários a vulso.
Gostei de tudo, mas sublinho o Luís Durães
que, ao lado de uma Sofia luminosa,
lhes desejo continuada invasão pelas palavras.


Depois, uma Joana aparece em céu de primavera
e se junta a David, que Santos é também.
Doutro modo escrito,
a "poesia está em tudo o que vive"
e "na luta dos homens"
e "no olhar em frente" (Mário Dionísio).


Este link responde a Luís Pinto:
valorizar um texto com o talento de uma voz,
ou não,
é uma falsa questão.
Já A. Pinto Correia avança no "olhar em frente"
que tanta falta nos faz.


Descartando ou não o filósofo,
a mesma resposta vou usar.
Desta feita,
com a ajuda de Sebastião da Gama,
meu amigo e professor primário,
poeta da Arrábida e arredores.


(Cfr., aqui, o título "Promessa")


Dizia ele que o mais importante
é que nos entendamos,
quer leiamos Cleópatra
quer leiamos Cleopátra!!!


Sobre o Mário e a Cornucópia,
duas palavrinhas.
A Cornucópia existe e os Luíses também!
O Cintra, o Gaspar, o Pinto e o Durães,
entre outros.
Sobre o Mário
(tão esquecidos são
os Mários neste país:
Leiria, Viegas, Botas...)
Dionísio, só tenho a dizer que
nos conhecemos no supermercado.


Sim!
A poesia está em todo o lado.


Por fim, Amora Silvestre.
Que delicioso nome!
Bergmann aplaudiria com todas as mãos.
Eu também.
O melhor do mundo para todos.
Porque a utopia existe
em todos os quadrantes desta infantil
humanidade que ainda ousa usar a guerra
para adiar os seus profundos problemas.


Este último comentário dedico-o aos Mários
e aos Luíses e a todos os Nomes
que assim sentem.

Ponto. abraços.

sábado, 19 de maio de 2007

CEM ANOS


Pablo Picasso, Demoiselles d'Avignon, 1907* by moma.org
Falta o resto da ficha técnica.




Infelizmente, não posso traduzir para português este título. Fica assim. Aliás, nada mais é preciso. Nem título! O quadro está exilado em New York, desde 1939, no MoMA (The Museum of Modern Art - 11 West 53 Street - NY 10019 - 5497), simplesmente entre a 5ª e a 6ª avenidas. Isto, sim! Isto é uma tela. Merci, mon ami, Pablo!

Mais informações: moma.org




(...) "apenas para sozinho não ficar
como sozinho sim ali a olhar para a parede
opaca com este quadro que nunca muda
de posição nem de cor um quadro
verde mate com uma candeia acesa
um puro e terrível picasso exclamei
alguém me perguntou se eu o conhecia
sim andei com ele na escola conheço-o bem
reconheço-o em cada bocadinho de papel tinta
tela óleo verniz olhares estranhos corpos
de visões loucas e ternas reconheço-o sempre
afiámos os nossos lápis com a mesma faca
fomos companheiros de carteira sinto o espanto
nos seus olhos com muita admiração
fomos amigos foste amigo do picasso
interrogavam-se derretidos de louvores indirectos
fui sim
há problema em ter sido amigo dele
não não não é isso então o que é bem pois
como assim e outra vez ainda
nós também somos teus" (...)

excerto de um texto a publicar mais tarde


quinta-feira, 17 de maio de 2007

MEMORIES I



S/título. Acrílico sobre papel de parede, 1988 @manus



Lamento interromper esta corrente poética,
mas pedem-me, agora, coisas mais palpáveis.
Do tipo: memórias para os vindouros.
Nunca percebi o que isso é!
Cheira-me sempre a vinho do douro,
ou mais lá de baixo, com caves em Vila Nova
de Gaia, que não é, propriamente, o Porto.
Gosto do Porto. Sempre apoiei as iniciativas
do norte, do sul e do centro.
Gosto do sabor e do corpo de coisas palpáveis.
Não resisti ao desafio.

Aqui fica a primeira impressão.



(SEM TÍTALO)





Em pezinhos de lã
chegou-se à minha beira
e perguntou-me
o que estás aqui a fazer
olhei
eu não estava de facto
a fazer nada
disse-lhe
estou a chorar

mas não vejo lágrimas
nenhumas

pois não
se visses era milagre
e os ministros não fazem milagres

pois não

pois estou aqui
a chorar
para que os ministros
possam fazer milagres

e o menino acrescentou
era disso que suspeitava
mas não chores

foi nesse momento
que me apercebi
que começara a chover

as flores da primavera
sorriram para o menino
que rebolou na relva
para apanhar uma gota
que fugia para são bento
sabes eles sabem
que que que que o sonho
não comanda a vida
finalizou o menino
e eu voltei para casa



quarta-feira, 16 de maio de 2007

EXISTEM POETAS?


Monotipia em papel reciclado (23x22 cm) @ manus 2007




A FALA ACIMA DOS NOMES
Quando as mãos se unem à volta do homem,
para nomearem cada respiração dos nomes,
fica o movimento interno a dizer palavra-vida.
A sensação vazia vai-se com a noite do silêncio pleno,
respiração suave dos nomes que nos prendem.
A visão e o vislumbre, o rosto e a fala, a voz e o manto
- desmonotonia do espaço suplente e desvirtuado:
memória, resistência, povo.

Conjugação perfeita de esforços unidos
para nova fonte, nova aventura;
a aventura da fala em música nossa
na revolução da vida, dos corpos, das relações,
dos sonhos.

A fala acima dos nomes é vitória do povo,
da suspensa retirada da liberdade oculta;
novo modo de vida, fala de liberdade.
Os escritos estão podres. É necessário ternura.
O conteúdo maravilha-se. Existem poetas!

NÃO DA LUA





Doem-me os olhos
a alma já negra anda
não sei se parta se fique
neste entretanto bicudo
talvez vá talvez fique
ainda não sei o que melhor é
vou ficar por momentos
a escrever esta situação
indecisa e verdadeira
indesejável e não porreira
doem-me os dedos
e eu não queria
preciso deles para amanhã
pintar mais uma tela
desejava tanto
que mais ousassem
só que faralhado tudo está
e ainda dizem que o erro
é que nos ensina
outra forma de afirmar
que é ele que comanda a vida
cá por mim mesmo enganado
esta é imperfeita forma de vida
apesar de algumas juras
e justas queixas do luís
má fortuna dos erros
não nasce do nada de alguém
provavelmente
nem nada disto existe
e mesmo que existisse
resta-nos
a grande capacidade
de dizer não

segunda-feira, 14 de maio de 2007

DESTINAÇÃO


Pintura em acrílico (65x50 cm) sobre papel @manus 1988



o que seria de nós
sem computers
sem auto-estradas
sem portagens
sem aviões
sem engarrafamentos
sem céu cinzento
sem inferno

o que seria de nós
sem relógios
sem hora de ponta
sem semáforos
sem supermercado
sem multibanco
sem euros
sem petróleo

o que seria de nós
sem a lua
sem o sol
sem bússola
sem andorinhas
sem primavera
sem jogos
sem pimenta

o que seria de nós
sem dor
sem esperas
sem futuro
sem olhos
sem mãos
sem sonho
sem quimeras

o que seria de nós
sem bi
sem carta
sem livros
sem cds
sem ouvidos
sem música
sem cabelos


o que seria de nós
sem nada
sempre à espera
à espera
sempre à procura
à procura da perfeição
de nós

QUINHENTOS


Pintura em acrílico (120X120 cm) sobre tela @manus 1995

Texto para a TRUCA, que continua a ser uma querida,
com quinhentas (imaginem!), sim, 500 edições.
Bem-hajas, sempre, Luís da Truca e da Raposa.
Vale a pena meter o bedelho. Juro!

http://www.truca.pt
http://www.estudioraposa.com/






LUGARES


começar é tudo sim é tudo
é o contrário do sabor a nada
da hesitação a murmúrios mesmo lágrimas

começar é uma aventura
com movimentos sempre infantis
como a vela de um barco que muda
de acordo com o vento
sem nunca esquecer o leme

percebo pouco de navegação
e se assim não fosse e tivesse dinheiro
já tinha comprado um catamaran só para me divertir
sem quaisquer pretensões olímpicas

é por isso que prefiro continuar em terra
onde as sementes dão flores
e os perigos não são menores
em todas e quaisquer esquinas
e cruzamentos

em cada mudança de rumo
há sempre perigo de morte e de vida
acho e penso eu que sou optimista
e até gosto deste sentimento ocidental português

um risco para pisar o limite impossível
e assumir que se pisa
bem sei





quinta-feira, 10 de maio de 2007

AVISO À NAVEGAÇÃO








Sem título






Nem desconfiava
desta antiga desafinação
inventor fica calado
antes de ser mercador
talvez seja injusto
neste comentário
só que tão queimado
pelo silêncio optei
não quero qualquer vingança
já que disso nada sei
doem-me logo os dentes
de pensar essa hipótese
deixem-me como sou
mesmo em manhãs de nevoeiro
suponho que dom sebastião
não regresse
por uma dor de simples humano
vivam pois devagar
que a pressa é má conselheira
vive numa floresta abandonada
e já lhe fizeram o funeral
só não percebo por que andam ainda
a elogiar a sua sabedoria
devagar é que se pode ser feliz
o contrário é morrer na estrada
cá por mim prefiro a praia
de preferência
a tentar salvar alguém
até porque além das queixas do jorge
só ouvi elogios ao sueste
mergulhamos na fuzeta
e vamos parar a olhão
dispensando tamanho exagero
comemos perceves na salema
e vamos de visita à falésia do infante
um minuto depois
ou apenas ao serão

AS ÁRVORES



&

AS PESSOAS


Nunca o saberei. É difícil adivinhar o que vai na alma do outro.
Somos pessoas vivas. Temos sentimentos. Sentimos frio, medo e fome.
Somos de carne, osso e sangue. Apesar do volume d’água.
Provavelmente, por isso. A água é primordial. O fogo também.
Nunca o saberei. Talvez por tudo isso e outras coisas mais.
Onde se esconde a água, o sonho, o mais profundo mistério da vida?
Não há razão para a esperança. Adivinho-lhe apenas o sentido...
Os tempos que correm não são da nossa natureza. Apresentam-se
calculistas, previstos, enumerados. São da Era do Insensível,
Programada e Operacional. Simplesmente, e em nome da mão,
quando a energia falha, não funciona.
É essa a diferença. A máquina depende da electricidade; o eu-pessoa depende,
apenas e só, da sua própria energia.
Nem destino, nem promessa. Em cada dia que nasce, é a capacidade
de sonhar que comanda a vida. É o querer enorme e magnífico que emerge
do silêncio e marca a identidade dos movimentos.

*
As árvores são seres vivos. Agitam-se, crescem e dão flores, quando é esse
o seu destino, ao ritmo do tempo.
As pessoas crescem, movem-se, ausentam-se, agitam-se e, até, fogem,
de acordo com as circunstâncias.

*
Não há razões para duvidar das pessoas.
Mudam de morada. Esquecem-se de o comunicar.
Sonham o melhor dos mundos.
Esquecem-se de o procurar. E, um dia, morrem.
As árvores, pelo menos, não fogem. Quando morrem, morrem de pé.
E não se nota tanto!

quarta-feira, 9 de maio de 2007

A PROMESSA

Sebastião da Gama, José Régio e Cristovam Pavia
Um trio de luxo que não se pode rejeitar em lado algum.







O Sonho


Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

- Partimos. Vamos. Somos.


Sebastião da Gama
in " Pelo sonho é que vamos "

O VIOLINO DE GARDEN



Era de infinito que eu estava a falar
afinal o infinito é tão simples como
as preocupações diárias e o pão de azeite
para quem ama a serra de azeitão
mais conhecida por arrábida
é tudo relativo na teoria de eistein
curiosamente também no dia a dia da gente vulgar
é claro que tudo o que está em cima
é semelhante ao que está em baixo
e versa-vice de algum modo de aproxima
mas prefiro o som do violino
que juntamente com o do piano
alegram a vida e a alma
é só experimentar juntá-los
noites após noites e em local adequado
para sonatas e melodias de encantar
como as de alguns criadores sem nome
já que estamos no século do futuro
e o futuro nunca teve nome
vem aí devagarinho
só os homens têm pressa
o futuro nunca é mensurável nunca
mesmo com a agitação dos dias
a inflação e o caderno de contas nacionais
o futuro é o presente melhor
à partida
à chegada revela-se o mesmo de sempre
a corda na garganta
as contas sempre difíceis de manter em dia
e aquela chatice do tempo
ou melhor dizendo da sua falta
é isto a vida dos homens
deixo para uma mulher falar das mulheres
sempre insatisfação
e o infinito a espreitar sempre sobre a nossa cabeça

terça-feira, 8 de maio de 2007

FIGURA



Já não sei
onde era princípio
e fim
nunca saberei.
Já não sei
como começou.


Do começo do caminho
até ao fim da estrada,
nada saberei.
E voltar atrás
nada resolve.


Vou no vento
na tempestade
da montanha.
Conheço o musgo
e o gelo.
De nada me vale
conhecer.


Estou
onde a vida
se escapa
entre os dedos
E

a visão
da alma
me salva


Perdi-me
e
não
sei
por
quê

terça-feira, 3 de abril de 2007

AQUI, TERRA DA (RE)CRIAÇÃO

Como estreia, nesta terra de todos, o barro joga bem com recriação
das origens, sustento da alma, raízes, esperança, sonho.
Porventura, paz e pombas.
Têm-me pedido poesia, contos, biografia, ilustrações, pinturas,
crónicas, memórias e não-sei-que-mais... Tudo o que puderes!
OK! Tentarei dar o melhor do pouco e, por vezes, do muito pouco que tenho.
Acima de tudo (e isto não é novidade para quem me conhece), prometo a ironia,
o sarcasmo, o mal-dizer, desta feita em dose maior e por conta própria,
como convém a um ser livre.
Só que esta atitude implica, igualmente, redobrada e atenta responsabilidade.
Pronto, já ultrapassei os limites do sério... Raios de sol me queimem!
Vou, pois, colocar a púcara ao forno que se faz tarde.
Bom dia, pessoal da estiva!!!